Gripe Espanhola de 1918 x Covid-19
A
1ª Grande Guerra ainda ardia na Europa em 1918, enquanto uma gripe, causada
pelo “Vírus Influenza” se alastrava, e devido a algum tipo de censura, muitos
países não enfatizavam a doença. A Espanha era a que mais contabilizava a peste,
assim esta recebeu erroneamente o nome de Gripe Espanhola.
Cerca
de 50 milhões de vítimas morreram com a gripe que se tornou pandemia, e a
medicina da primeira metade do século XX conhecia poucas alternativas –
distanciamento social e uso de máscaras – porém, para parte da população
mundial essas medidas eram vistas como erradas (semelhantemente a hoje), a
negação à gripe e às medidas de saúde foram rechaçadas, mas não podemos
esquecer, vivíamos em uma época com menos informações e pouca tecnologia.
Ao
Brasil essa doença pandêmica chegou de navio do estrangeiro, como era de se
esperar, pois os navios que faziam o transporte intercontinental de pessoas e
mercadorias. A doença acabou matando o nosso então Presidente Rodrigues Alves,
que havia sido eleito e não chegou a tomar posse. A gripe espalhou-se
rapidamente e, cerca de 34 mil pessoas morreram, sendo que a população
brasileira à época era de aproximadamente 30 milhões de habitantes. (Não existe unanimidade entre as fontes sobre o total
de mortos na epidemia da gripe espanhola).
O
medo vagava pelas ruas e gerava pânico, os corpos dos mortos permaneciam nas
ruas por semanas, quando o poder público passou a obrigar a retirada e o
enterro das vítimas da gripe, em valas coletivas e muitas como indigentes.
Os "tratamentos infalíveis" se espalhavam,
como era o caso do uso de tabaco, balas de ervas e tônicos como remédios para a
doença. Outras recomendações era queimar alfazema ou incenso para "limpar
o ar" — tudo sem comprovação científica. Ficou famosa uma mistura de
cachaça, alho, mel e limão que prometia curar a infecção, conforme alguns
historiadores foi nesta época que surgiu a Caipirinha.
Relatos da época sobre a Gripe Espanhola no Rio de Janeiro. Pandemia
de 1918
Rapidamente, a cidade se viu à
beira de um colapso. Faltavam alimentos, remédios, médicos, hospitais que
recolhessem os doentes mais graves. Itens básicos foram alvo de
superfaturamento e escassez, impedindo que as demandas instauradas pela
moléstia fossem atendidas. Havia dificuldades para prestar socorro para toda a
população, pois os serviços permaneceram restritos aos centros urbanos, ficando
as localidades distantes em grande carência. Pouco a pouco, as ruas da cidade
se transformaram em um mar de insepultos, pela falta de coveiros para enterrar
os corpos e de caixões onde sepultá-los. A moléstia ganhava uma violência nunca
antes presenciada. (Sampaio Vianna, 1919).
Uma testemunha ocular do evento
empresta-nos aqui suas lembranças, para que possamos ter uma ideia mais clara
do impacto psicológico causado pela epidemia, que, segundo ela: Foi uma coisa
pavorosa! Nunca, em toda minha vida, vi algo que chegasse perto daquela situação
infernal! Não tinha na cidade, rua em que pelo menos em uma casa, a família
inteira falecera. Em muitas, todos da família estavam acamados, e cabia a quem
pela rua passasse alimentar e dar remédios. Geralmente eram os coveiros,
lixeiros e policiais que acudiam, dando remédio e alimentando. As pessoas
colocavam panos negros nas janelas e portas das casas, para que eles soubessem
que ali tinha gente doente e viessem socorrer. O pior de tudo é que estava
morrendo gente aos borbotões, e o governo dizia, nos jornais, que a gripe era
benigna. Certo dia, os jornais noticiaram mais de quinhentos óbitos, e mesmo
assim a gripe era benigna, benigna, (...) As mortes eram tantas que não se dava
conta do sepultamento dos corpos. Na minha rua, da janela, se via um oceano de
cadáveres. As pessoas escoravam os pés dos defuntos nas janelas das casas, para
que a assistência pública viesse recolher, mas o serviço era lento, e aí tinha
hora que o ar começava a empestear; os corpos começavam a inchar e apodrecer.
Muitos começaram a jogar os cadáveres em via pública. Quando a assistência
pública vinha recolher os cadáveres, havia trocas dos podres por mais frescos,
era um cenário macabro (...) (Nelson Antonio Freire, 11.9.1990).
As charges ilustram as ferrenhas críticas veiculadas
nos jornais cariocas à medicina oficial, que apresentava controvertidos
diagnósticos e explicações na maior parte das vezes incompatíveis com a
realidade que se instaurava no seio de uma sociedade que vacilava à beira de um
colapso. Vencidos em seu próprio terreno, a maioria dos médicos reproduzia o
discurso da inevitabilidade do mal, mas, na verdade, estavam diante de algo
muito além de seu conhecimento e da capacidade da ciência e da medicina da
época.
A forma irônica, utilizada não só por parte da
imprensa, como por setores políticos, na apresentação de suas críticas,
revelava a não aceitação do fato de
estarem sendo atacados por uma doença desconhecida, os altos escalões e as
classes abastadas também se mostravam insatisfeitos, o que desencadeou grandes
tensões entre a sociedade e as autoridades governamentais e sanitárias. O
discurso da medicina oficial passou a ser encarado com desconfiança pela
população, uma vez que este não conseguia explicar o que estava acontecendo.
Tais críticas devem ser encaradas também como fruto da insegurança da população
diante da desestruturação de sua vida cotidiana (Delumeau, 1993).
Texto tirado da Internet - Adriana da Costa Goulart - Mestre em história
social pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
Contribuição
Prof. de História Rogério Carriconde